segunda-feira, 28 de junho de 2010

Trabalho Fim de Semestre.

Postura Pragmatista- Estética e Ética-
ARTE e Política Democrática - Por uma sociedade de multidão.


Vital começar este trabalho, considerando que há cerca de seis bilhões de pessoas no mundo, e que estas, reconhecem, em sua grande maioria, invariavelmente, que uma das únicas coisas que as aproximam, são o fato de serem humanas, logo, da mesma espécie. Elas, todas, dentre sua grande maioria, por vezes não notam, que o fato de sermos da mesma espécie,humanos, nos faz partilhar o mesmo, a vida.

Ademais, a diversidade entre a humanidade já é consenso e também pauta política.De antemão, nessa multidão, alguns já estão “abraçados”.
Elas se afirmam, únicas, por vezes não-relacionais( em “guetos“), devido a não perceberem o mesmo(o outro), a vida. Na vida, as vezes fica explícito, a territorialidade demarcada por parte de grupos, deixando a ocupação espacial quase como um campo minado e apropriado por tal etnia, grupos sociais e de maneira excludentes e por demais defensivas.

As multidões são quando estes “guetos” se notam. Instaura-se a democracia. Todas as vozes.

A partir da alegação de Protágoras: “ o homem é a medida de todas as coisas”, e da incorporação de que somos bilhões, e que destes bilhões, alguns são comuns por identificações que lhe são particulares, arquetípicas,( nacionalidade, sexualidade, gosto, etc...), segue-se que não é plausível encontrarmos critérios válidos para toda e qualquer gente, sendo este homem medida de todas as coisas, ainda mais específico e particular, enquanto múltiplo e variável.

A “pretensão” universalista de gerir uma ética normativa, ou de fundamentar uma objetividade cientificista e epistemológica predominante no conhecimento, esbarra na singularidade e na intersubjetividade humana, nos guetos, nas “individualidades”,nos sentimentos, frutos da multiplicidade ontológica do ser, e das diferentes interpretações de mundo construídas nas relações dos tantos sujeitos com a realidade constituída, e dada factualmente dentro da experiência de cada pessoa.

Está “reconsideração” filosófica, postula uma inerência relativa e pessoal,a uma subjetivação da experiência de cada sujeito, portador de um código autônomo e existencial único, e a uma hermenêutica própria e imprescindível, mais intrínseco ao humano, do que o padrão, o cânone, o clássico. É própria e também culturalmente herdada.

Resgatando a condição de “natureza” da humanidade, como quis Rousseau, chega-se a uma compaixão primitiva e com forte amplexo na sobrevivência e na semelhança(espécie) ,seja ela(a compaixão), “instintiva” ou de determinância empírica razoável *
(- sem que importe a discordância entre românticos, religiosos, biólogos ou fenomenólogos).

Disso,desdobra-se uma identificação “real“, de cunho imaginativo, do reconhecimento sensível de um compartilhamento dela mesma, a vida. As multidões se aproximam. Quase se olham no olho.

Dois sujeitos, únicos, semelhantes enquanto humanos, reconhecendo-se. Seja por “faro” ou por pensamento...
As Multidões se cruzam. Mesmos em outros. Os ouvidos se abrem, o “diálogo” se faz necessário, histórico-dialético ...

Rorty diz: “ Os pragmatistas querem colocar a esperança social no lugar que o conhecimento tem tradicionalmente ocupado”. ( pág. 88)

A convivência requerida pelos pragmatistas, abarca a alteridade, extensão de uma identidade equivalente, de outro sujeito,que mesmo diverso,um eu, imerso no mundo.
Ser-no-mundo.Com outrem. Dotado de sensibilidade e esperança messiânica de justiça.

Quando as multidões se vêem, os rostos e os olhos reivindicam a responsabilidade pelo outro, pela contingência dos acontecimentos e o curso histórico.

É inerente a construção de uma sociedade mais solidária, partimos de noções reparativas históricas e de origens sensíveis, não com cartilhas ou prescrições morais,comportamentais, anistóricas e incondicionais,mas sim, tornando clara, antes de tudo, o exercício de práticas que permitam uma convivência harmônica e equivalente entre os bilhões de indivíduos dessa aldeia global.

Esta solidariedade, mesmo de origens sensíveis, nascem, requeridas por um juízo do devir, de uma metalinguagem da história, uma auto-reparação, nascente no direito dos sujeitos afetados.

A postura pragmatista nasce em consonância com o desafio de tornar a filosofia cada vez mais próxima da empiria e do cotidiano, devendo se afastar do almejo de ser um conhecimento fora do domínio humano, e de ser um saber que constitua a verdade e a universalidade como princípio básico de sua gnose. É um entendimento sucinto de que a filosofia precisa deixar de ser “vertical”.
Menos axiomática.

Para Rorty, esta tão dita verdade, sempre filosoficamente “buscada”, deve ter um uso “acautelatório”, pois sua justificação pode ser facilmente refutada diante de outros contextos,fatos, ao longo do tempo. Pela vida. História ininterrupta.

Esta verdade tão defendida pelos cânones e pelos clássicos, provou-se diante desta História, por vezes falha e equivoca.
Não há verdade, que por ser justificável, fundamentada e argumentada fabulosamente, seja incondicional, validada pela eternidade. Em qualquer contexto.

No “seio” do pragmatismo, nasce uma noção que abarca a razão, porém sem pretensões universalistas ou fundamentalistas. A razoabilidade passa a ser um princípio mais flexível, elástico, humano. Diz respeito a possibilidade de ser razoável, assertivo, coerente, porém sem regras ou leis rígidas, fixas, atemporais.

Num exemplo claro de “inaugural” auto-crítica dos filósofos, Heidegger reconhece com perspicácia a problemática filosófica e sua demanda de clareza, quando afirma uma confusão intrínseca a esse domínio:

“Três perigos rondam o pensamento. O bom perigo, e por isso, salutar, é a proximidade do poeta que canta. O mau perigo, e por isso o mais agudo, é o próprio pensamento. Tem de pensar contra si mesmo, o que só consegue raramente. O pior perigo e por isso confuso, é a filosofia”

Nesta passagem,o pensador, indiretamente critica um procedimento filosófico cartesiano, no qual se adota uma divisão entre sujeito e objeto, com fins de definição ontológica e epistemológica (res-cogitan e res-extensa).

A crítica se volta para a noção de idéias inatas, de uma mente pura (determinantemente intelectual e de conceitos claros), que se relaciona com o mundo “externo” como se ele acontecesse de maneira alheia, “fora”, tendo a mente um poderio “controlador”. Organizativo. Moral. Classificatório.
Preciso.
A mente está tão imbricada no mundo e na experiência, que torna difícil separá-los. .
Esta separação radical entre sujeito e objeto, o “afastamento” do mundo propriamente dito , além da pretensão universalista, proporcionaram morais torpes, condutas incoerentes, e por fim, desembocaram em equívocos históricos de todas as naturezas ( vide o escravagismo, a inquisição). As multidões se “chocaram”. Tudo em nome, por vezes, de fundamentalismos dogmáticos.

O olhar para o outro deve ser de equivalência, semelhança e “igualdade” de direitos. Sujeito x Sujeito. Sujeitos dotados de sua intersubjetividade e contingencial relação com o mundo. Com outras subjetividades.

Como diria uma música, que tem a voz de Maria Bethânia:

“ Não esquecer
ninguém é o centro do universo
assim é maior, o prazer,
você verá que é mesmo assim,
a história não tem fim,
continua sempre que você,
responde sim,
a sua imaginação” ( Brincar de Viver, Guilherme Arantes)

Nos tempos atuais, a democracia dá autonomia e reergue a estima dos sujeitos singulares, festejando e gozando do prazer e privilégio de afirmar suas multidões, suas vastas interpretações e identidades, suas abissais profundidades sensíveis.Sua imaginação criativa e brilhante.
De diversas origens, histórias,culturas. Todos compondo o mesmo, o mundo.O espaço. A vida.

Duas vertentes se revelam altamente eficazes na construção desta sociedade solidária requerida, a partir do vislumbre histórico e de caráter reparador, dos acontecimentos da civilização : primeiro a arte, através da estética, com seus viés dionisíaco e com alto poder alinhador entre sensibilidade e expressão,
e segundo, a democracia, através da ética, e sua possibilidade de inclusão e reparação social.

A estética, por vezes relegada, nos traz com importante colaboração o aprimoramento do sensível, a necessidade da empiria, dos sentidos, do mundo da vida, e com isso,a empatia, o altruísmo e a solidariedade, a partir do contato com a poesia, com o sonho, com a esperança do porvir. Um porvir profético. Uma consonância entre sensibilidade e expressão. Puro Afeto.

Resgata, através de Nietzsche, o poder de Dionísio, a vontade de potência,o desejo, a imaginação,a pulsão, a sensualidade, a brincadeira, o jogo, a criatividade. O prazer em estar, ser.
Realizar a poesia que ronda, vida. A performatividade xamânica. Numa cosmogonia total.

Esta realização nos dá tamanha satisfação, e nos leva com fruição a alteridade, ao outro, ao mútuo, a partir de nós, únicos, mesmos. Todos. Afeto de multidões.
Frutos de sentimentos,estes,“fios” condutores de uma identidade humana, formadora, moral, como “previu” Hume em suas incursões textuais e filosóficas.

O contato com a arte, vazão do sensível, por exemplo,é dinamizadora de processos catártico-dialéticos e uma ferramenta revolucionária.

Subjetivamente vivenciada, porém de forte impacto axiológico, objetivadas a posteriori, inclinam o sujeito a mudança pragmática de comportamento ou no mínimo a uma reflexão direcionada para auto-crítica. Contextualizada. Social.
A contemplação tem seu espaço preservado, porém redimensionado. Se pode aglutinar outros subterfúgios, nesse ínterim “pleno” da arte em movimento. (revolução, superação, ...)

O exercício artístico pode promover uma consciência engajada e preocupada com o seu entorno. Com outros sujeitos. A arte, exercitada pelos sujeitos na história, referem-se a exemplos de seu caráter estético e político, social,promovendo antinomias reveladoras e não postergadoras. Como um grito que se impõe pelo “desespero” ou por sua força projetiva.

Salve Augusto Boal, Nelson Rodrigues, Rogério Duprat, a nossa baianíssima Tropicália e seu Tropicalismo antropofágico-musical. A guitarra elétrica e toda transgressão.

.O Teatro Oficina, comandado pelo “lendário” Zé Celso Martinez, atualmente em turnê( Dionisíacas em Viagem), passando por Salvador, com sua proposta de Teatro de Extádio( arenas e arquibancadas)traz a seguinte passagem em seu material de divulgação:

“ Grandioso Demais, coletivo demais. Próximo das origens verídicas do teatro, Festa Popular e grande catarse [...] Estádios de nossa época. Onde há de se tornar realidade o teatro de amanhã. Como foi o teatro na Grécia. O Teatro Para a Vontade do Povo e a Emoção do povo”.

Esta passagem, “proferida” por Oswald de Andrade, revela a verdadeira “missão” do teatro e da arte: a comoção das massas, uma catarse coletiva e “visionária”, uma honrosa menção a diversidade do seu povo e as vontades e emoções indistintas. Um comunismo orgástico. Orgiástico. Em todos os termos. Sexuais e não sexuais. ( A companhia Uzyna Uzona ( Teatro Oficina) é muito conhecida como a companhia que “promove” o nu de cunho sexual, mas seus trabalhos, como repertório, compõe temas para além deste.)


Durante duas peças desta turnê, intituladas Tâniko - Rito do Mar e Cacilda- Estrela a Vagar, as entrelinhas saltam. Em dois momentos, atores desfilam com bandeiras, onde ficam grafadas, o símbolo do comunismo.

A arte e a sensibilidade são grandes aliadas em empreitadas históricas que reivindicam um olhar crítico e reparador. Um olhar além dos olhares convencionados. Um olhar contextual, comunal, cultural, antropológico.

Desde que Levi Strauss “inaugura” a antropologia, pautado em uma reformulação do conceito de Cultura, não como uma bagagem intelectual,e sim como um “arcabouço” de práticas sociais referentes a comunidades determinadas, referenda e legitima uma ascendência importante ao particular, tornando o conhecimento como um todo voltado para a perspectiva do contexto, da ocasião, da situação, da “leitura”, conferindo respeito e autonomia para saberes que fogem a risca do cientificismo e universalismo clássico. Vide nossa cultura popular.

O multiculturalismo, oriundo desta institucionalização da Cultura enquanto prática social , permite a legitimação de normas, costumes, regras, princípios, que não são universais, mas dizem respeito as comunidades e seus métodos e linguagens , vida e “recorte” próprios.
O maior benefício para história e para a sociedade de nosso tempo, é a inclusão destes agentes sociais “marginais“,referendados na política pública de seu país, verdadeiramente democrática e reparadora.

A democracia quer escutar as vozes. Ouvir a todos. Mesmo sendo caótico seu território e tal pretensão. Por estar atenta as entrelinhas, e a seu faro curioso, ela se ajeita nesta jornada, nesta política abundante. Desses sujeitos bilhões. Ela é a política das multidões.

A atual política cultural brasileira por exemplo, na perspectiva do Ministério da Cultura, e dentro do Programa Cultura Viva, oriundo da experiência do ex-Secretário de Cidadania e Cultura, Célio Turino, tem por um de seus princípios, o fomento a Cultura Popular e principalmente as expressões que nascem no berço de populações tradicionais (negros, índios, ciganos, etc) e de forte poder simbólico, denominando a diversidade como origem e os Pontos de Cultura, como espaço privilegiado. afirmando a multidão.

Para se ter noção, na Bahia, tem-se espaços(Pontos de Cultura), como o Teatro Vila Velha ( grande equipamento cultural), e a ECAIG ( Escola Capoeira da Angola Irmãos Gêmeos de Mestre Curió).

Por uma sociedade de multidão, quer dizer para a nossa, sociedade do nosso tempo.
Voltada para o exercício da sensibilidade, através da arte, de uma imaginação catártica, realizadora e revolucionária, e da expressão de cada eu autêntico, fluído, solidário, e aberto para a diversidade, para o olhar de reconhecimento da alteridade. Para Cultura, como um ideário coletivo, comum, identitário, característico, de parte das multidões.

A intersubjetividade humana em seus meandros , deve ser assimilada como originária desta revolução iniciada em cada sujeito,que encontra respaldo na democracia, incluindo as vozes “marginais”, que repara “chagas” históricas, que abarca singularidades, e o máximo de agentes sociais humanos.

Bibliografia:
Souza, José Crisóstomo de. Filosofia, Racionalidade e Democracia. Os debates Rorty e Habermas, Editora UNESP.

Leão, Emmanuel Carneiro Leão, Heidegger e a Modernidade- A correlação Sujeito e Objeto. 1977

Emmanuel Levinas- Texto- Ética e Alteridade

Material de Divulgação da Turnê Dionisíacas- Teatro Oficina- Uzyna Uzona

Nietzsche, Os Pensadores. Vida e Obra, 3 edição, 1983

Hume, David. Os Pensadores. Vida e Obra. 2 edição, 1980

Descartes, René. Discurso do Método. 2 edição. Ed Martin Claret

Rousseau, Jean-Jaques,Os Pensadores. Vida e Obra. 2 edição. 1978

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Vídeo

O Híbrido e o Predominante

Grande parte da experimentação e investigação artística, em termos significativos, tem acontecido no interior de um estilo híbrido e conectado com a integralidade das linguagens. Em toda a expressão que se desdobre, há traços curiosos de uma fusão elementar e complementar. Som, palavra,imagem, movimento, corpo, fundam-se numa poética agudamente interessada em descortinar fronteiras e revelaram-se mutuamente simbióticas, num pacto estético e catártico.


Na década de 60, com o afloramento da Performance, não se limitando a desenvolver um campo expressivo, esse movimento começa a influenciar sutilmente as linguagens tradicionais, imbuindo-as de uma poder ampliador e de notório interesse por áreas similares. Daí por diante, nasce perspectivas denomidadas: Dança-Teatro,Música Cênica,Artes Performáticas, etc ...


O olhar contemporâneo em âmbitos macro e micro, diz respeito a um diálogo sincero e aproximador com a diversidade. Em termos artísticos, importante observar que não há uma perda do caratér identitário e ontológico com relação a essas novas denominações ou escolas. Coerente observar, que o genuíno, desta nova forma, é que há uma predominância dentro dessas poéticas. O híbrido não está numa mistura em doses equivalentes. Mas numa direção que insere dentro de uma identidade autônoma, influências de outras.


As linguagens tradicionais absorvem para si, recursos das outras, de modo a enriquecer o caratér expressivo e alcançar uma complementaridade estética. Na Música por exemplo, nasce o cantor intérprete, em um cruzumento entre a poética do ator e do cantor.

Sempre há um ponto de partida, uma linguagem mãe. É nela, que uma vastidão de outras, penetram, trazendo sua marca, sua influência.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Próximos Textos:

O Híbrido e o Predominante - A linguagem da contemporaneidade.

Estética e Contigência - Experiência Artística.

Formação em Arte - Novas perspectivas.